MUITAS MEMÓRIAS E UMA HISTÓRIA: 50 ANOS DA FESTA DE SANTO ANTÔNIO, O PADROEIRO DE BATAYPORÃ

 Danilo Leite Moreira

Batayporã é um município localizado na região Sudeste do Estado de Mato Grosso do Sul. Seu surgimento se deve às ações do Tchecoslovaco, Jan Antonin Bata, dono da Companhia de Viação São Paulo-Mato Grosso, a colonizadora responsável pelo processo de colonização, em 1953. Com a chegada dos primeiros colonizadores e colonos, aos poucos, o lugar que era apenas mata, foi ganhando suas primeiras ruas e casas. A cada dia chegava um caminhão, vindo do Oeste Paulista, trazendo uma família, assim, aos poucos o pequeno vilarejo ia ganhando forma e gente.

Desde o início da colonização, as atividades religiosas sempre estiveram presentes no pequeno vilarejo. Alguns moradores destacaram que essas atividades eram realizadas através de terços, que eram rezados nas casas, ou de missas, que eram celebradas com a passagem do Frei Luiz Maria Tomas das Flores, em uma pequena igreja de madeira, onde, anos mais tarde, foi construída a atual igreja Matriz.

Após ser erguida a primeira igrejinha de madeira, os moradores do então distrito de Batayporã iniciaram as discussões para escolha do Padroeiro. Quem nos narrou como se deu a escolha do atual Padroeiro foi Antônia Mourão Cheirubim, mais conhecida como Dona Tunica, filha de José Antônio Mourão, um dos primeiros moradores e comerciantes do município. Em suas narrativas, destacou que: “Como a igreja era de madeira e não havia nenhuma imagem, quando se realizava qualquer cerimônia, a senhora Ana Nunes levava algumas imagens para colocar no altar. Como meu pai era um dos comerciantes, em uma de suas viagens, na busca de mercadorias ao interior do Estado de São Paulo, disse para senhora Ana que traria algumas imagens para colocar na igrejinha de madeira, e disse que gostaria de trazer uma imagem de Santo Antônio, para colocar como o padroeiro da Igreja. Assim, após retornar de viagem, Mourão trouxe três imagens para serem colocadas na Igreja, sendo: uma, de Nossa Senhora, uma, de São João, e outra, de Santo Antônio (CHEIRUBIM, 2010)”.

Ao certo não se sabe o ano da escolha, e se esse fato foi o único na decisão de ter Santo Antônio como o padroeiro da cidade de Batayporã. O que se sabe é que pela devoção do senhor José Antônio Mourão a Santo Antônio se deu a escolha do Padroeiro e que, desde então, no dia 13 de junho, todos os anos a comunidade católica batayporaense se reúne para celebrar o padroeiro do município.

Imagem: Missa de Santo Antônio – 2007.
Imagem: Missa de Santo Antônio – 2007 // Fonte: Arquivo imagético da Paróquia Santo Antônio de Pádua – Batayporã-MS

Assim, dava início a primeira festividade da Festa de Santo Antônio, ou popularmente conhecida também, como a “Festa do Padre”. São por meio desses fragmentos de memória, tais como: o livro tombo, relato de festeiros e fotos, que busquei rememorar e contar um pouco dos 50 anos dessa tradição local.

Como sabemos, a festa do padroeiro é dividida em duas partes: uma religiosa e a outra social. A Festa Religiosa se inicia com a missa solene ao Padroeiro, ao final da missa, o padre realiza a bênção e a distribuição dos pãezinhos de Santo Antônio e, por fim, os fieis saem em carreata, pelas ruas da cidade, com a imagem do Santo que vai à frente com os fieis atrás fazendo o maior buzinaço. A solenidade religiosa termina com o Padre benzendo os veículos.

Apesar dessas tradições se repetirem todos os anos, muitos moradores não sabem como elas surgiram. Assim, busco, no decorrer do texto, discorrer um pouco sobre essas tradições que vivenciamos ano após ano. Por exemplo, a bênção dos pães se inicia com a família Sanches. Todos os anos, a Senhora Cecília distribuía os pães em uma vila da cidade, até que o Padre Ângelo Maschi a convidou para doar os pães na missa Santo Antônio, desde então, todos os anos a senhora Cecília Sanches, junto de sua família, doa os pães, que são distribuídos na porta da Igreja, ao final da missa.

Imagem: Missa de Santo Antônio – 2019.
Imagem: Missa de Santo Antônio – 2019 // Fonte: Arquivo imagético da Paróquia Santo Antônio de Pádua – Batayporã-MS

Sobre a Carreata, Romana Duarte destaca que essa tradição surgiu com as cavalgadas, onde um cavaleiro ia carregando a imagem de Santo Antônio, percorrendo as ruas da cidade junto de uma tropa que ia atrás. Foi somente na década de 1980 que as cavalgadas passaram a ser carreatas. Os primeiros relatos sobre as carreatas podem ser encontrados no livro tombo da festa de 1983, se tornando uma tradição. Desde então, todos os anos, os moradores percorrem as ruas da cidade com a imagem do Santo.

Imagem: Carreata a Santo Antônio -198?
Imagem: Carreata a Santo Antônio -198? // Fonte: Arquivo imagético da Paróquia Santo Antônio de Pádua – Batayporã-MS
Imagem: Carreata a Santo Antônio – 1998
Imagem: Carreata a Santo Antônio – 1998 // Fonte: Arquivo imagético da Paróquia Santo Antônio de Pádua – Batayporã-MS

Com relação à festa Social, segundo consta no Livro Tombo, de número I, da Paróquia de Santo Antônio de Pádua, escrito por Antônio Galiotto, a primeira festa do Padroeiro ocorreu no dia 28 de junho de 1970. Os festeiros escolhidos foram: “Diego Sanches e esposa, Cantidiano Duarte e Esposa e Laurindo Mustafá e esposa. Houve muito esforço da parte de alguns, e menos da parte de outras, mas foi comovente a colaboração popular, oferecendo prendas ou trabalhando na preparação da festa […]. A festa foi precedida de um concurso da rainha da Festa, com venda de votos em favor da festa e que teve o resultado de Cr$ 2.340,00 com muito respeito e dignidade foi feita a coroação da vencedora a Srta. Maria Helena Jorge […] que obteve 1.050 votos, que diz bem alto da colaboração e boa vontade deste povo” (GALIOTTO, 1970, p. 6).  Cabe destacar que a primeira festa foi realizada em um salão de madeira de chão batido, que ficava ao lado da pequena igreja de madeira. Senhora Marisa Michelini destacou que: “veio muita gente da cidade vizinha para as festas aqui, em Batayporã”.

No ano seguinte, em 1971, a festa começava a ganhar força. Na busca de atender a demanda do público que vinha crescendo, um pavilhão e uma cozinha foram construídos, para atenderem as demandas das festividades. Conforme consta no livro tombo: “Tudo correu em perfeita ordem […] Churrasco, almoço, leilões, jogos e rifas, e um formidável torneio de futebol de Salão em campo improvisado ao lado da Igreja” (GALIOTTO, 1971, p. 13).

Imagem: Festa de Santo Antônio – 1973
Imagem: Festa de Santo Antônio – 1973 // Fonte: Arquivo imagético da Paróquia Santo Antônio de Pádua – Batayporã-MS

Muitas dessas tradições foram sendo repetidas, ano após ano, algumas delas se modificaram com o passar dos anos e outras delas deixaram de existir. Como é o caso do concurso da Boneca Viva. Esse concurso surgiu por volta da década de 80, quando a senhora Odele Pinto de Andrade, junto com Dona Alta Sãovesso propuseram para o Pároco Antônio Galiotto para realizarem o concurso da Boneca Viva, como forma de angariar fundos para a Igreja. Segundo Marisa Michelini, esse concurso foi uma tradição que sua mãe Odele trouxe da cidade de Gaúcha, do interior do Paraná. No início, as meninas se vestiam de bonecas e desfilavam. A competição se dava por meio da venda de votos: a menina que obtivesse o maior número de votos vencia o concurso e recebia como prêmio uma boneca. Com o passar dos anos, Maria Tereza Fruguli Dan assumiu a frente do concurso, como destacou em suas narrativas, “o concurso sempre se manteve com muita dificuldade”. Até que anos mais tarde, a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) tomou a frente do concurso, passando a se chamar  Rainha da Festa, perante as dificuldades em realizar a concurso, no final da primeira década dos anos 2000, teve a sua última edição.

Imagem: Concurso Boneca-Viva – 1995
Imagem: Concurso Boneca-Viva – 1995 // Fonte: Arquivo imagético da Paróquia Santo Antônio de Pádua – Batayporã-MS
Imagem: Concurso Rainha da Festa – 2003
Imagem: Concurso Rainha da Festa – 2003 // Fonte: Arquivo imagético da Paróquia Santo Antônio de Pádua – Batayporã-MS

Outra tradição a ser destacada e que vem atravessando gerações, é o leilão de gado, que tem início após o tradicional almoço da Festa de Santo Antônio. Primeiro se faz o leilão  dos bolos, e logo após, o leilão de gado, sacos de milhos e diversas outras prendas que são obtidas por uma equipe de festeiros, por meio de doações feitas por pessoas da própria comunidade. Os leilões sempre iniciam com o leiloeiro, sempre nas figuras do Valter Ravaze (Picão) ou do Sérgio Agnaldo (Sérgio do Banco), mostrando o bolo ou animal a ser leiloado, para que as pessoas possam dar o lance. E assim começa e vai até o fim, quando ninguém oferece um lance mais alto e o leiloeiro bate o martelo.

Imagem: Leilão Festa de Santo Antônio – 2004
Imagem: Leilão Festa de Santo Antônio – 2004 // Fonte: Arquivo imagético da Paróquia Santo Antônio de Pádua – Batayporã-MS

Cabe destacar que essa tradição está presente desde a primeira festa. Os primeiros leilões foram realizados pelo senhor Toninho Madalena, esses leilões ocorriam dentro do próprio salão. Nos anos seguintes, já sob a direção do senhor Neodir Borba, foi construída uma mangueira de madeira ao lado do Salão Paroquial, para que os compradores pudessem olhar o animal, que seria arrematado. Desde o ano 2010, até as festas atuais, na busca de preservar o bem estar animal, os leilões passaram a ser digitais, onde o animal é filmado e projetado em telas nos dias da festa.

Assim como as tradições são inventadas e perpetuadas, muitas delas resistem ao tempo, porém, outras, não. No ano de 2020, a festa de Santo Antônio completa 50 anos, se tornando uma típica tradição local. Desde o início da festa, em 1970, esse é o primeiro ano que a festa social do padroeiro não será realizada, por motivos de força maior: uma pandemia que atingiu o mundo nos últimos meses, em decorrência do Coranavírus (Covid-19), tem feito vítimas no mundo todo. Infelizmente, ainda não poderemos nos reunir para comermos as comidas típicas das barraquinhas ou beber aquele quentão quentinho, não poderemos dançar aquele forró ou ir ao típico almoço de domingo. Esse é o momento de ficarmos em casa, para que, daqui a alguns meses, estejamos todos juntos e possamos nos unir novamente, para celebrar muitas e muitas festas lindas para Santo Antônio, o padroeiro de Batayporã.

Desejo que todos fiquem bem!

E viva Santo Antônio!

Imagem: Missa de Santo Antônio – 2019
Imagem: Missa de Santo Antônio – 2019 // Fonte: Arquivo imagético da Paróquia Santo Antônio de Pádua – Batayporã-MS
Danilo Leite Moreira
Graduado em História pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus de Nova Andradina (UFMS/CPNA). Mestre e Doutorando em História pelo Programa de Pós-graduação da Universidade Federal da Grande Dourados (PPGH/UFGD) e professor do Curso de Pedagogia da Associação Novaandradinense de Educação e Cultura (ANAEC).